Já há um bom tempo que me
incomodo com a questão do sofrimento, não porque seja chique pensar sobre as
agruras e aprender com elas, mas pelo fato de ser um ser feito de dores e
pensamento. Dito isso, estou enquadrando a dor em duas categorias, a dor como
sintoma da disfunção biológica, psíquica, emocional, social e por aí vai, e a
dor que o ato de pensar nos causa. Como a dor é um sinal, então, pensar e, por
consequência, sentir dor é sinal de que tem algo de errado com este nosso
mundo, ou, no mínimo, o erro está na nossa forma de pensar. De qualquer
maneira, fica claro que não há ser humano livre do sofrimento: nem o ignorante,
nem o sábio; nem o clássico, nem o romântico; nem o rico, nem o pobre; nem o
santo, nem o profano. Se é humano, então está debaixo da bendita maldição da
dor.
Não pretendo fazer nenhum tipo de
ontologia do sofrimento, nem muito menos história filosófica do mesmo, não
tenho capacidade para tanto. O que pretendo é apenas postar em algum lugar,
acompanhada com algumas considerações, um fragmento de uma música que acabo de
ouvir da Bossa que é sempre Nova. Mas antes disso decidi dizer que existem
algumas muitas pessoas que vivem a vida fugindo desesperadamente do sofrimento,
pensam que nessa fuga vão encontrar a felicidade numa esquina chique de Paris,
numa sauna, num carrão de meter inveja, numa mesa gourmet caríssima, nos corpos
esculturais, nas clínicas de yoga, de estética e a lista aumenta a depender da
conta e da vontade cega de felicidade.
Entrementes, existem alguns
outros tantos infelizes que vivem buscando muito sofrimento para sua vida
agora, now, porque acreditam que vai valer a pena conquistarem um status
quo, para enfim não mais sofrerem, por isso sofrem na “caminhada” porque quando
chegarem lá tudo será Miami beach. Por outro lado, ainda existe um
outro grupo de sofredores que acredita que nasceram mesmo para sofrer e que por
isso têm de sofrer até o fim da vida, justificam-se que nascemos chorando e
morremos nos lamuriando, o que resta?
Pois bem, acredito que o
sofrimento é parte inalienável dessa nossa condição humana, portanto ter
consciência do mesmo de maneira adequada nos ajudar a lidar melhor com ele,
consequentemente com a própria vida. O filósofo Luiz Felipe Pondé assegura que
a chave para a felicidade é aprendermos a lidar com o sofrimento, mas é óbvio
que tem muita coisa a mais que isso em relação ao estado de felicidade. Uma
dessas coisas são as escolhas que fazemos em relação ao sofrimento. Contudo não
é tão somente a escolha que se faz ao decidir sofrer ao fazer o outro sofrer, é
mais que isso. Quando somos conscientes de que, enquanto aqui estivermos, não
escaparemos dessa bendita maldição, só então que possuídos desse pensamento
ficamos um pouco mais livres para decidir por coisas mais prudentes por uma
vida menos indecente ou infeliz.
Então é assim que o poeta canta:
“Sofrer é da vida. Eu já me convenci”, e com isso ele decide aceitar o
sofrimento de não querer de volta uma paixão que, no momento, poderia ser
prazerosa, do que, penso cá com meus botões, depois sofrer algo muito maior
que, de fato, o faria infeliz, digo, apesar de haver paixão ele já não via mais
sentido no relacionamento entre ambos, por isso ele diz: “adeus, minha querida.
Não foi pra você que eu nasci”. Então o que estou tentando dizer é que existem
sofrimentos felizes e sofrimentos infelizes, os sofrimentos infelizes são fruto
de decisões movidas apenas pelos afetos comoventes e fortes, que os gregos
chamam de pathos, vinculados às paixões. Já o sofrimento feliz é aquele
que você pondera, avalia, e decide correr o risco de sofrer, mas é um
sofrimento que dialoga melhor com a razão, que faz sentido, pelo menos para o
momento. Este é o que chamo de sofrimento-sacrifício, que tanto pode ser em
favor do outro, como, sobretudo, em benefício próprio. Esse último tem um “que”
de razoabilidade, de equilíbrio, de dignidade, de saber que não se está dando
um passo totalmente cego no escuro, ou melhor, talvez se tenha uma leve
sensação de que esse sofrimento feliz vale mais a pena. Já em relação ao
sofrimento infeliz, resta-me ter muita pena de quem só vive tomando decisões
comovido por ele, isso quando dele se tem consciência, ainda tem isso. Dito
isso, só sobra lugar para os sofrimentos contingenciais, mas para esses, a
gente só canta um pedacinho da música, “sofrer é da vida”, e sempre com uma
oração no peito: “Pai nosso (...) livra-nos do mal”, amém!
2012 © Lucas Nascimento
Texto publicado originalmente em www.lucasnascimento.jimdo.com
em 2011
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